quinta-feira, 16 de abril de 2009

Quando o invisível nos salta aos olhos



Ali, num cruzamento, entre construções ostensivas, onde nenhum desconto é o bastante para o consumo justo e justificável, ele vagava cambaleante com uma moedinha numa mão, e a outra vazia.
Desistido de entender sua própria realidade, mas também a outra que não era a dele, não entendia mais nada, e nem queria mais.

A temerança substituiu a temperança e era somente com ela que ele batia de levinho, a mãozinha fraca no vidro fumê que acelerava um pouquinho à sua aproximação. Só por higiene, nada pessoal.
Quem tinha a sorte de vê-lo, passando bem diante dos faróis, notava logo a desdita e desviava a mirada. Outras poluições eram bem menos desagradáveis do que aquela, inútil que era, pousada num ser sem banho.

E os passinhos seguiam cambaleando o ser, equilibrando uma existência em quase nada, no meio fio da falta de valor. Afinal, que valor pode ter alguém sem banho e sem mais moedas a não ser as que lhe dão? Nenhum, é claro! O valor de alguém vem das moedas que tem e alguém que tem moedas decerto teria um banho também.
O rostinho apagado e puído, escondido numa fragilidade vergonhosa e envergonhada, mal podia deixar que seus olhos se mostrassem àqueles a quem olhava sem ver.

Como se vestisse um saco de pão e um sapato antes gasto do que jazia agora a seus pés, tudo lhe ancorava e lhe desistia. Até que o semáforo, corado de falta de jeito e desaprovação, aliviou-se em permissão para que todos se livrassem de tamanho constrangimento. Todos, menos um. E aquele semáforo entendeu a relatividade de Einstein em menos de um segundo.

Texto e foto:
Camila Caringe